Aconteceu com um amigo de um amigo meu, um ser humano


          Realmente é interessante como a gente, ser humano, acaba passando por várias coisas distintas durante o nosso breve período de vida. Como por exemplo que aconteceu com um amigo de um amigo meu, ele estava sozinho no ponto de ônibus e chegou uma senhora com aquela cesta móvel, coisa que só gente velha usa, e perguntou para ele se o ônibus que ia pra centro já havia passado. Ele achou estranho, pois o ponto em que estavam era exatamente no centro e não fazia sentido o que a senhorinha estava falando. Mas, custou a idosa entender que ali já era centro e que os ônibus que passam por ali geralmente vão para o terminal ou geralmente vão para bairros afastados. Porém, a velha ainda insistia que queria ir para o centro e deu nomes: "aquele ali perto da padaria Pão Bocado, do lado da farmácia Juremacura, esquina com o espetinho Churrassic Park.". Claro que esse conhecido meu jamais saberia aonde ficam essas coisas e, sem paciência, repetiu à senhora que ali já era centro e que não sabia aonde era esse lugar. Até que por um momento a idosa olhou para o rapaz e o questionou, com tranquilidade: "não frequenta o centro, não é?." Incomodado, o rapaz disse que havia acabado de voltar do centro. A senhora continuou: "mas não pegou passe?." Ele disse que nem o ônibus havia pego, muito menos o passe. A velhinha, muito insistente, continuou com o papo: "mas, você disse que não tinha ônibus pra lá, como acabou de voltar de lá?" Sem paciência alguma, o rapaz mandou essa senhora à merda e foi rude: "a senhora só pode estar de brincadeira com a minha cara, a gente está no centro, o centro é aqui!." A idosa, muito calma, insistiu: "mas, se aqui é o centro, então aonde estão as cadeiras e a água?." O rapaz enfurecido, com veias saltando de nervos, disse com grosseria: "A gente está em São Paulo, velha escrota do caralho, água é o que menos tem aqui. Cadeira, no máximo o que a senhora vai ver é a de rodas, já já, se não parar com essa conversa." Então, a senhora acabou se assustando a conversa chegou ao fim. O ônibus não passou, após um tempo chegou uma moça mais jovem, que esperou um tempo pra perguntar se o ônibus que ia pro centro já havia passado. A senhora fez um gesto negando, com cara de apavorada e o rapaz, de cara fechada, encarou a moça com um olhar de fúria. Ele já estava suspeitando de que seria uma pegadinha, algo comum em grandes capitais, foi então que parou um carro de um conhecido da velha e perguntou se ela estava ali esperando o ônibus para ir ao centro. Foi então, que a senhora e a moça pegaram carona com moço e o amigo do amigo meu ficou sozinho no ponto de ônibus com cara de idiota ao cubo Já em casa, acordando pra ir trabalhar, viu no jornal da manhã, na tv, a seguinte reportagem: "gás de carro de espetinhos de carnes explode e põe fogo no centro espírita. Donos e clientes de uma padaria próxima tentaram ajudar o dono do carrinho de espetos a apagar o fogo, mas não conseguiram e o centro acabou desabando, prendendo os fiéis dentro. Todos os espíritas presentes no local morreram. Foi, então, que ele reconheceu o tal centro que a senhora tanto falou, ao ligar os fatos. Naquele momento bateu o arrependimento e ele sentiu muito o peso das circunstâncias, ao perceber que simplesmente ofendeu uma senhora de idade sem ela fazer nada pra ele, que ela manteve a calma enquanto ele a agredia com as suas palavras de baixo escalão. Esse amigo do amigo meu aprendeu uma lição grande: a de escutar mais os outros, procurar saber mais do que se trata quando alguém nos questiona de algo, ser mais gentil, não descontar frustrações e raivas em pessoas que não fizeram nada pra gente, nem mesmo tratar mal a quem nos trata mal, muito menos a quem nos trata bem e que a paciência é algo essencial para o ser humano. Até hoje ele acha que matou a senhora, pelo menos é esse o sentimento dele perante ao que ocorreu e diz que não dorme bem desde que aconteceu esse fato trágico. 
          Interessante como tudo pode parecer o que não é quando o assunto é ser humano. Por exemplo, um primo meu, que sempre passava pela mesma rua em que tinha um violeiro barbudo, todo sujo, com roupas rasgadas e que fedia gambá morto, um alguém que ele nunca parou pra dar atenção, ou muito menos pra dar um trocado. Meu primo disse que achava esse velho nojento, que ele devia procurar emprego, ou fazer algo útil ao invés de ficar ali ganhando uns trocados pra pinga. Esse velho tinha uma placa com ele, era um papelão com a seguinte frase: "ouça o som e dê uns trocados, se achar bom, pois preciso comer pra manter o tom, respeite a minha música e o meu dom." Uma frase interessante para um morador de rua de uns sessenta e poucos anos, mas que ninguém parecia dar importância. Certo dia esse primo meu, como sempre, passou pela rua falando no seu celular de última geração. Já era meio tarde da noite, a rua estava meio deserta e só havia o velho morador de rua em sua direção. Meu primo, por precaução, antes de chegar no quarteirão em que o velho mendigo estava, atravessou a rua e continuou o seu trajeto, ainda falando no celular. Surgiu então à sua frente um alemão, barba bem feita, vestindo terno e sapatos, estava bem arrumado e exalava bem. O meu parente o reparou e cumprimentou-o , mas, ao passar por ele, simplesmente foi surpreendido pelo rapaz que o prendeu por trás, pedindo o celular e todo o dinheiro, apontando uma faca para a barriga enquanto o sufocava.  Meu primo, claro, tentou resistir ao assaltante e até conseguiu se soltar, mas acabou se ferindo com uma verdadeira facada no bucho e acabou caindo no chão. O bandido, ao perceber que meu primo estava no chão, logo armou para esfaqueá-lo de vez e foi surpreendido pelo mendigo, que usou o próprio violão para derrubar o meliante e bateu várias vezes até o deixar desnorteado. Pegou o celular do meu primo, pediu a senha e ligou para o resgate e para a polícia. Levou o meu primo, no colo, até a sua casa, na calçada, e o manteve aquecido lá enquanto os reforços estavam a caminho. Quando a ambulância chegou, o mendigo ajudou os paramédicos a ajustar meu parente no furgão e, quando a polícia chegou, ele entregou o bandido e esclareceu todo o acontecimento. Meu primo ficou bem, teve muita sorte da facada não ter atingido nenhum órgão vital. Após a recuperação, ele voltou à sua rotina e, como de costume, voltou a passar na rua do velho barbudo e fedorento. Primeira coisa que fez foi dar um abraço bem caloroso no senhor e o agradeceu muito pela ajuda e até pediu pra tocar uma música pra cantarem juntos, mas infelizmente o velho estava sem violão, pois quebrou o que tinha ao usar como arma contra o assaltante, Meu primo, então, fez o que devia fazer e, no dia seguinte, deu um violão novinho pro mendigo herói, assim cantaram uma música linda, aquela do Gonzaguinha que fala que a vida é bonita. Só sei que até hoje meu primo comenta desse fato e fala do quanto ele aprendeu que julgar as pessoas é algo realmente estúpido a se fazer. Que, ao julgar o mendigo pela sua aparência, jamais imaginava que fosse uma boa pessoa, com boas intenções, que agiu com preconceito ao atravessar pra outra calçada, que não sentiu, jamais, que o alemão fosse fazer o que fez ao ter reparado que era uma pessoa bem apresentável, aprendeu na pele que quem vê cara não vê coração e hoje ele dá mais valor ao que a pessoa é e não ao que ela tem, Caso contrário, se ele não tivesse atravessado a rua por medo do mendigo lhe causar algum mal, certamente ele não teria passado por aquilo, mas, também, não havia aprendido essa bela lição.
          O mundo hoje em dia não é mais tão humano quanto fora há pouco tempo atrás. O ser humano não se dá mais o valor que deveria, não respeita mais os seus verdadeiros costumes, seus verdadeiros interesses, seus companheiros de vida. O ser humano passou a focar em aparência, em poder, em ganância, em superioridade e se esqueceu de que essa porra de planeta em que vivemos é uma enorme comunidade, pelo menos na teoria era pra ser. O ser humano parou de pensar no conjunto para pensar apenas em si próprio, parou de se importar com o bem estar do grupo para pensar no bem estar próprio. O ser humano contemporâneo deixou de ser o que o seu próprio nome diz. O ser humano atual de humano não tem nada. Mas, ainda há uma senhora num ponto de ônibus, com paciência e sabedoria, com coração bom de respeitar e ser gentil com até mesmo quem lhe trate mal. Ainda há um mendigo que possa fazer um ato generoso, heroico e ajudar até mesmo quem nunca lhe ajudou, ou até mesmo que nunca lhe deu atenção, a quem sempre o julgou mal e fingiu que ele não existia, mas esse velho sujo e nojento foi quem estava lá, dando a mão, corpo e barba pra poder ajudar e salvar uma vida de quem sempre o menosprezou. Ainda há esperança no mundo. O ser humano tem que voltar a pensar mais nos outros, a pensar mais no que pode ser feito juntos. O planeta Terra é distinto em tudo, em raças, em meios ambientes, em climas, em territórios, em linguagens, em animais, em tudo. Mas, a diferença não é motivo para se criar calamidades públicas, insultos, guerras e revoltas, como se faz hoje em dia. A diferença é somar quando o assunto é ser humano. A diferença é algo que precisa ser aproveitada por todo mundo, é na diferença que a saem as coisas mais fantásticas do mundo. O que falta é consciência, falta alguma coisa pesar na consciência do ser humano pra que ele volte a pensar, volte a entender as suas raízes. o do porque que ele existe e têm vários outros semelhantes juntos nesse lugar tão imenso. Realmente seria muito interessante, mesmo, o ser humano perceber que o que faz a diferença é unir o diferente. Eu sou um ser humano que, ainda, põe fé na humanidade e espero que eu não seja o único dentre os bilhões que existem por aí. 



Autor do texto: Caio Estrela.

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